O EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO
Cap. 13 – Que a Mão Esquerda Não Saiba o
Que Faz a Direita
ADOLFO -
Bispo de Alger, Bordeaux, 1861
11 – A
beneficência, meus amigos, vos dará neste mundo os gozos mais puros e mais
doces, as alegrias do coração, que não são perturbadas nem pelos remorsos, nem
pela indiferença. Oh!, pudésseis compreender tudo o que encerra de grande e de
agradável a generosidade das belas almas, esse sentimento que faz que se olhe
aos outros com o mesmo olhar voltado para si mesmo, e que se desvista com
alegria para vestir a um irmão! Pudésseis, meus amigos, ter apenas a doce
preocupação de fazer aos outros felizes! Quais as festas mundanas que se pode
comparar a essas festas jubilosas, quando, representantes da Divindade, levais
a alegria a essas pobres famílias, que da vida só conhecem as vicissitudes e as
amarguras; quando vedes esses rostos macilentos brilharem subitamente de
esperança, desprovidos de pão, esses infelizes e seus filhos, ignorando que
viver é sofrer, gritavam, choravam e repetiam estas palavras, que, como finos
punhais, penetravam o coração materno: “Tenho fome!” Oh!, compreendei quanto
são deliciosas as impressões daquele que vê renascer a alegria onde, momentos
antes, só havia desespero! Compreendei quais são as vossas obrigações para com
os vossos irmãos! Ide, ide ao encontro do infortúnio, ao socorro das misérias
ocultas, sobretudo, que são as mais dolorosas. Ide, meus bem-amados, e
lembrai-vos destas palavras do Salvador: “Quando vestirdes a um destes
pequeninos, pensai que é a mim que o fazeis!”
Caridade!
Palavra sublime, que resume todas as virtudes, és tu que deves conduzir os
povos à felicidade. Ao praticar-te, eles estarão semeando infinitas alegrias
para o próprio futuro, e durante o seu exílio na Terra, serás para eles a
consolação, o antegozo das alegrias que mais tarde desfrutarão, quando todos
reunidos se abraçarem, no seio do Deus de amor. Foste tu, virtude divina, que
me proporcionaste os únicos momentos de felicidade que gozei na Terra. Possam
os meus irmãos encarnados crer na voz do amigo que lhes fala e lhes diz: É na
caridade que deveis procurar a paz do coração, o contentamento da alma, o
remédio para as aflições da vida. Oh!, quando estiverdes a ponto de acusar a
Deus, lançai um olhar para baixo, e vereis quantas misérias a aliviar, quantas
pobres crianças sem família; quantos velhos sem uma só mão amiga para os
socorrer e fechar-lhes os olhos na hora da morte! Quanto bem a fazer! Oh!, não
reclameis, antes agradecei a Deus, e prodigalizai a mancheias a vossa simpatia,
o vosso amor, o vosso dinheiro, a todos os que, deserdados dos bens deste
mundo, definham no sofrimento e na solidão. Colhereis neste mundo alegrias bem
suaves, e mais tarde… somente Deus o sabe!
SÃO VICENTE
DE PAULO - Paris, 1858
12 – Sede
bons e caridosos: eis a chave dos céus, que tendes nas mãos. Toda a felicidade
eterna se encerra nesta máxima: “Amai-vos uns aos outros”. A alma não pode
elevar-se às regiões espirituais senão pelo devotamento ao próximo; não
encontra felicidade e consolação senão nos impulsos da caridade. Sede bons,
amparai os vossos irmãos, extirpai a horrível chaga do egoísmo. Cumprido esse
dever, o caminho da felicidade eterna deve abrir-se para vós. Aliás, quem
dentre vós não sentiu o coração pulsar, crescer sua alegria interior, ao relato
de um belo sacrifício, de uma obra de pura caridade? Se buscásseis apenas o
deleite de uma boa ação, estaríeis sempre no caminho do progresso espiritual.
Exemplos não vos faltam; o que falta é a boa vontade, sempre rara. Vede a
multidão de homens de bem, de que a vossa história evoca piedosas lembranças.
O Cristo não
vos disse tudo o que se refere a essas virtudes de caridade e amor? Por que
deixastes de lado os seus divinos ensinamentos? Por que fechar os ouvidos às
suas divinas palavras, o coração às suas doces máximas? Eu desejaria que se
votasse mais interesse, mais fé às leituras evangélicas; mas abandona-se esse
livro, considerado como texto quimérico, mensagem cifrada; deixa-se no
esquecimento esse código admirável. Vossos males provêm do abandono voluntário
desse resumo das leis divinas. Lede, pois, essas páginas ardentes sobre a
abnegação de Jesus, e meditai-as.
Homens
fortes, armai-vos; homens fracos, fazei da vossa doçura, da vossa fé, as vossas
armas; tende mais persuasão e mais constância na propagação de vossa doutrina.
É apenas um encorajamento que vimos dar-vos, e é para estimular o vosso zelo e
as vossas virtudes, que Deus permite a nossa manifestação. Mas, se quisésseis,
bastaria a ajuda de Deus e da vossa própria vontade, pois as manifestações
espíritas se produzem somente para os que têm os olhos fechados e os corações
indóceis.
A caridade é
a virtude fundamental que deve sustentar o edifício das virtudes terrenas; sem
ela, as outras não existiriam. Sem a caridade, nada de esperar uma sorte
melhor, nenhum interesse moral que nos guie; sem a caridade, nada de fé, pois a
fé não é mais do que um raio de luz pura, que faz brilhar uma alma caridosa.
A caridade é
a âncora eterna de salvação em todos os mundos: é a mais pura emanação do
Criador; é a sua própria virtude, que Ele transmite à criatura. Como pretender
desconhecer esta suprema bondade? Qual seria o coração suficientemente perverso
para, assim pensando, sufocar em si e depois expulsar este sentimento
inteiramente divino? Qual seria o filho bastante mau para revoltar-se com essa
doce carícia: a caridade?
Não ousarei
falar daquilo que fiz, porque os Espíritos também têm o pudor de suas obras;
mas considero a que iniciei como uma das que mais devem contribuir para o
alívio de vossos semelhantes. Vejo frequentemente os Espíritos pedirem por
missão continuar a minha tarefa; eu os vejo, minhas doces e queridas irmãs, no
seu piedoso e divino ministério; eu os vejo praticar a virtude que vos
recomendo, com toda a alegria que essa existência de abnegação e sacrifícios
proporciona. É uma grande felicidade, para mim, ver quanto se enobrece o seu
caráter, quanto a sua missão é amada e docemente protegida. Homens de bem, de
boa e forte vontade, uni-vos para continuar amplamente a obra de propagação da
caridade. Encontrareis a recompensa dessa virtude no seu próprio exercício. Não
há alegria espiritual que ela não proporcione desde a vida presente. Permanecei
unidos. Amai-vos uns aos outros, segundo os preceitos do Cristo. Assim seja!
CÁRITAS -
Martirizado em Roma, Lyon, 1861
13 –
Chamo-me Caridade, sou o caminho principal que conduz a Deus; segui-me, porque eu
sou a meta a que vós todos deveis visar.
Fiz nesta
manhã o meu passeio habitual, e com o coração magoado venho dizer-vos: Oh, meus
amigos, quantas misérias, quantas lágrimas, e quanto tendes de fazer para
secá-las todas! Inutilmente tentei consolar as pobres mães, dizendo-lhes ao
ouvido: Coragem! Há corações bondosos que velam por vós, que não vos
abandonarão; paciência! Deus existe, e vós sois as suas amadas, as suas
eleitas. Elas pareciam ouvir-me e voltavam para mim os seus grandes olhos
assustados. Eu lia em seus pobres semblantes que o corpo, esse tirano do
Espírito, tinha fome, e que, se as minhas palavras lhes tranquilizam um pouco o
coração, não lhes saciavam o estômago. Então eu repetia: Coragem! Coragem! E
uma pobre mãe, muito jovem, que amamentava uma criancinha, tomou-a nos braços e
ergueu-a no espaço vazio, como para me rogar que protegesse aquele pobre e
pequeno ser, que só encontrava num seio estéril alimento insuficiente.
Mais
adiante, meus amigos, vi pobres velhos sem trabalho e logo sem abrigo,
atormentados por todos os sofrimentos da necessidade, e envergonhados de sua
miséria, não se atrevendo, eles que jamais mendigaram, a implorar a piedade dos
passantes. Coração empolgado de compaixão, eu, que nada tenho, me fiz mendiga
para eles, e vou para toda parte estimular a beneficência, inspirar bons
pensamentos aos corações generosos e compassivos. Eis por que venho até vós,
meus amigos, e vos digo: Lá em baixo há infelizes cuja cesta está sem pão, a
lareira sem fogo, o leito sem cobertas. Não vos digo o que deveis fazer, deixo
a iniciativa aos vossos bons corações; pois se eu vos ditasse a linha de
conduta, não teríeis o mérito de vossas boas ações. Eu vos digo somente: Sou a
caridade e vos estendo as mãos pelos vossos irmãos sofredores.
Mas, se
peço, também dou, e muito; eu vos convido para um grande festim e ofereço a
árvore em que vós todos podereis saciar-vos. Vede como é bela, como está
carregada de flores e de frutos! Ide, ide, colhei, tomai todos os frutos dessa
bela árvore que se chama beneficência. Em lugar dos ramos que lhe arrancardes,
porei todas as boas ações que fizerdes e levarei a árvore a Deus, para que Ele
a carregue de novo, porque a beneficência é inesgotável. Segui-me, pois, meus
amigos, a fim de que eu vos possa contar entre os que se alistam sob a minha
bandeira. Sede intrépidos: eu vos conduzirei pela via da salvação, porque eu
sou a Caridade!
CÁRITAS -
Lyon, 1861
14 – Há
muitas maneiras de fazer a caridade, que tantos de vós confundem com a esmola.
Não obstante, há grande diferença entre elas. A esmola, meus amigos, algumas
vezes é útil, porque alivia os pobres. Mas é quase sempre humilhante, tanto
para o que a dá, quanto para o que a recebe. A caridade, pelo contrário, liga o
benfeitor e o beneficiário, e além disso se disfarça de tantas maneiras! A
caridade pode ser praticada mesmo entre colegas e amigos, sendo indulgentes uns
para com os outros, perdoando-se mutuamente suas fraquezas, cuidando de não
ferir o amor próprio de ninguém. Para vós, espíritas, na vossa maneira de agir
em relação aos que não pensam convosco, induzindo os menos esclarecidos a crer,
sem os chocar, sem afrontar as suas convicções, mas levando-os amigavelmente às
reuniões, onde eles poderão ouvir-nos, e onde saberemos encontrar a brecha que
nos permitirá penetrar nos seus corações. Eis uma das formas da caridade.
Escutai
agora o que é a caridade para com os pobres, esses deserdados do mundo, mas
recompensados por Deus, quando sabem aceitar as suas misérias sem murmurações,
o que depende de vós. Vou me fazer compreender por um exemplo.
Vejo muitas
vezes na semana uma reunião de damas de todas as idades. Para nós, como sabeis,
são todas irmãs. Trabalham rápidas, bem rápidas. Os dedos são ágeis. Vede
também como os rostos estão radiantes e como os seus corações batem em
uníssono! Mas qual o seu objetivo? É que elas veem aproximar-se o inverno, que
será rude para as famílias pobres. As formigas não puderam acumular durante o
verão os grãos necessários à provisão, e a maior parte de seus utensílios está
empenhada. As pobres mães se inquietam e choram, pensando nos filhinhos que,
neste inverno, sofrerão frio e fome! Mas tende paciência, pobres mulheres! Deus
inspirou a outras, mais afortunadas que vós. Elas se reuniram e confeccionam
roupinhas. Depois, num destes dias, quando a neve tiver coberto a terra, e
murmurardes, dizendo: “Deus não é justo!”, pois é esta a expressão comum dos
vossos períodos de sofrimento, então vereis aparecer um dos enviados dessas
boas trabalhadoras, que se constituíram em operárias dos pobres. Sim, era para
vós que elas trabalhavam assim e vossos murmúrios se transformarão em bênçãos,
porque, no coração dos infelizes, o amor segue de bem perto o ódio.
Como todas
essas trabalhadoras necessitavam de encorajamento, vejo as comunicações dos
Bons Espíritos lhes chegarem de todas as partes. Os homens que participam desta
sociedade oferecem também o seu concurso, fazendo uma dessas leituras que tanto
agradam. E nós, para recompensar o zelo de todos e de cada um em particular,
prometemos a essas obreiras laboriosas uma boa clientela, que as pagará em
moeda sonante de bênçãos, a única moeda que circula no céu, assegurando-lhes
ainda, sem medo de nos arriscarmos, que essa moeda não lhes faltará.
UM ESPÍRITO
PROTETOR - Lyon, 1861
15 – Meus
caros amigos, cada dia ouço dizerem entre vós: “Sou pobre, não posso fazer a
caridade”. E cada dia, vê que faltais com a indulgência para com os vossos
semelhantes. Não lhes perdoais coisa alguma, e vos arvorais em juízes demasiado
severos, sem vos perguntar se gostaríeis que fizessem o mesmo a vosso respeito.
A indulgência não é também caridade? Vós, que não podeis fazer mais do que a
caridade indulgente, faz pelo menos essa, mas fazei-a com grandeza. Pelo que
respeita à caridade material, quero contar-vos uma história do outro mundo.
Dois homens
acabavam de morrer. Deus havia dito: “Enquanto esses dois homens viverem, serão
postas as suas boas ações num saco para cada um, e quando morrerem, serão
pesados esses sacos”. Quando ambos chegaram à sua última hora. Deus mandou que
lhe levassem os dois sacos. Um estava cheio, volumoso, estufado, e retinia o
metal dentro dele. O outro era tão pequeno e fino, que se viam através do pano
as poucas moedas que continha. Cada um dos homens reconheceu o que lhe pertencia:
“Eis o meu, — disse o primeiro — eu o conheço; fui rico e distribui bastante!”
O outro: “Eis o meu. Fui sempre pobre, ah! Não tinha quase nada para
distribuir”. Mas, ó surpresa: postos na balança, o maior tornou-se leve e o
pequeno se fez pesado, tanto que elevou muito o outro prato da balança. Então,
Deus disse ao rico: “Deste muito, é verdade, mas o fizeste por ostentação, e
para ver o teu nome figurando em todos os templos do orgulho. Além disso, ao
dar, não te privaste de nada. Passa à esquerda e fica satisfeito, por te ser
contada a esmola como alguma coisa”. Depois, disse ao pobre: “Deste bem pouco,
meu amigo, mas cada uma das moedas que estão na balança representou uma
privação para ti. Se não distribuíste a esmola, fizeste a caridade, e o melhor
é que a fizeste naturalmente, sem te preocupares de que a levassem à tua conta.
Foste indulgente; não julgaste o teu semelhante; pelo contrário, encontraste
desculpas para todas as suas ações. Passa à direita, e vai receber a tua
recompensa.
JOÃO Bordeaux,
1861
16 – A
mulher rica, feliz, que não tem necessidade de empregar o seu tempo nos
trabalhos da casa, não pode dedicar algumas horas ao serviço do próximo? Que,
com as sobras dos seus gastos felizes, compre agasalhos para o infeliz que
tirita de frio; com suas mãos delicadas, confeccione roupas grosseiras, mas
quentes, e ajude a mãe pobre a vestir o filho que vai nascer. Se o seu filho,
com isso, ficar com alguns rendados de menos, o daquela terá mais calor.
Trabalhar para os pobres é trabalhar na vinha do Senhor.
E tu, pobre
operária, que não dispõe de sobras, mas que desejas, no amor por teus irmãos,
dar também um pouco do que possuis, oferece algumas horas do teu dia, do teu
tempo, que é o teu único tesouro. Faze alguns desses trabalhos elegantes que
tentam os felizes, vende o produto dos teus serões, e poderás também
proporcionar, a teus irmãos a tua parte de alívio. Terás, talvez, algumas fitas
a menos, mas darás sapatos aos que vivem descalços.
E vós,
mulheres devotadas a Deus, trabalhai também para as vossas obras piedosas, mas
que os vossos trabalhos delicados e custosos não sejam feitos apenas para ornar
as vossas capelas, ou para atrair a atenção sobre a vossa habilidade e
paciência. Trabalhai, minhas filhas, e que o resultado de vossas obras seja
consagrado ao alívio de vossos irmãos em Deus. Os pobres são os seus filhos bem
amados: trabalhar por eles é glorificá-lo. Sede os instrumentos da Providência,
que diz: “Às aves do céu, Deus dá o alimento”. Que o ouro e a prata, tecidos
pelos vossos dedos, se transformem em roupas e provisões para os necessitados.
Fazei isso, e o vosso trabalho será abençoado.
E todos vós,
que podeis produzir, daí: daí o vosso gênio, daí as vossas inspirações, daí o
vosso coração, que Deus vos abençoará. Poetas, literatos, que sois lidos
somente pela gente de sociedade, preenchei os seus lazeres, mas que o produto
de algumas de vossas obras seja destinado ao alívio dos infelizes. Pintores,
escultores, artistas de todos os gêneros, que a vossa inteligência venha também
ajudar os vossos irmãos: não tereis menos glória por isso, e eles terão alguns
sofrimentos a menos.
Todos vós
podeis dar: a qualquer classe a que pertençais, tereis sempre alguma coisa que
pode ser dividida. Seja o que for que Deus vos tenha dado, deveis uma parcela
aos que não têm sequer o necessário, pois em seu lugar ficaríeis contentes, se
alguém dividisse convosco. Vossos tesouros da terra diminuirão um pouco, mas
vossos tesouros do céu serão mais abundantes: colhereis pelo cêntuplo, lá em
cima, o que semeardes em benefícios aqui em baixo.
Fonte da imagem: Internet Google.