Vagueava no Espaço a pobre mãe suicida,
Apagara, a veneno, a luz da própria vida
Tentando reencontrar o filho que perdera
Em tóxicos letais,
Saudade, ânsia, aflição...
Não suportara mais.
E espírito da sombra, em lágrimas vagueia,
Entre a cegueira e a dor na angústia que a estonteia.
Dias, semanas, meses na loucura
Atravessara, atribulada e errante,
O império do remorso, ante a sombra gigante,
Sem confiança em Deus, infeliz e insegura,
A bradar o estribilho:
- Ah! meu filho, meu filho!...
Até que atormentada, louca e cega
Tateando no Além, eis que se apega
A desditoso irmão, também desorientado,
Que lastimava, em choro, os erros do passado...
Depois de ouvir-lhe os gritos,
O pobre respondeu:
- A senhora clamando é mais feliz do que eu,
Seu coração procura um filho muito amado,
Quanto a mim... quanto a mim,
Quero esquecer a mãe que tive no passado,
Que me repôs aqui, neste inferno sem fim...
E o pobre continuou, desalentado:
Saí daqui, um dia, a fim de melhorar-me,
Ela me recolheu nos braços com carinho...
Vestiu-me e festejou a júbilos e alarme,
O berço em que eu nascia...
A princípio, embalou-me em canções de alegria,
Entretanto, depois,
Na vida mais profunda entre nós dois,
Segregou-me no mundo, em egoísmo atroz,
Para ela, por fim, na ilusão que levava,
A terra éramos nós, o amor somente nós...
Criou-me escravo dela e fez-me minha escrava,
Afastou-me de tudo quanto fosse inquietação ou prova,
Em que me caberia
Acender, dentro em mim, a luz de vida nova.
Transformou-me a existência em longa fantasia
Para que eu fosse,
Desde o a b c da escola,
Um gênio de artimanhas,
Um moço de aventuras e façanhas,
Mas nunca um aprendiz
Que fosse no futuro um homem reto e feliz.
Quando atingi a plena juventude,
Contratou-me instrutores,
Que me ensinassem força, ação, elegância e beleza,
A fim de que, na forma, eu dominasse
Todos os contendores,
Fortes também por leis da natureza...
Deveria, por fim, ver todos muito abaixo,
A minha pobre mãe exigia e exigia
Que eu demonstrasse, em tudo, a excelência de um macho...
Depois, no entanto, veio a derrocada,
O tóxico apanhou-me a preguiça dourada...
Minha mãe jamais quis ensinar-me a sofrer,
Não quis que eu trabalhasse ou prezasse um dever...
Conheci a maldade e os impulsos medonhos
E a morte prematura, arrasando-me os sonhos...
De útil ou de bom nada tenho e nem fiz,
Sou agora, onde estou, um espírito infeliz!...
Ao escutar-lhe a voz e ao conhecer-lhe o nome,
Cai a pobre mulher na angústia que a consome;
Chama o desventurado e arrasta-se-lhe aos pés,
Avançando de bruços,
Ei-la a falar, desfeita em terríveis soluços:
- Agora compreendo...agora sei quem és...
E, em desespero, a voz grita, ante o céu sem brilho:
- Perdoa-me, meu Deus! ... Ah! meu filho, meu filho!
Autora: Maria Dolores
Nenhum comentário:
Postar um comentário