Clarindo era um menino para quem as dificuldades da vida chegaram cedo. Desde tenra idade viu-se, por contingências alheias à sua vontade, obrigado a lutar pela própria sobrevivência.
Morava numa pequena casa nos arrabaldes da cidade que, embora humilde, era um verdadeiro lar, pois ali existia o amor e a paz.
Quando seu pai desencarnou, vitimado por um acidente de trabalho, tudo mudou na vida de Clarindo.
Não contando mais com a presença e o amparo do pai, que trazia sempre o necessário para o sustento da família, a situação tornou-se muito difícil. Sua mãe foi obrigada a deixar o lar para trabalhar numa casa rica, e ele, Clarindo, também resolveu trabalhar de engraxate para ajudar nas despesas.
Como não tivessem com que pagar o aluguel da pequena casa, eles foram obrigados a mudar para uma favela, onde a generosidade de alguém lhes conseguiu um barraco.
Ao chegar na favela, o ambiente diferente e hostil causou infinita tristeza e angústia à pobre mulher que, intimamente, entrou a conversar com Deus:
“Oh! Senhor, o que será de meu filho? Obrigado a crescer neste ambiente, a conviver com criaturas de baixo nível moral, poderá vir a se tornar um delinquente! Ajuda-me! Sinto-me tão sozinha desde que meu querido esposo morreu! Mas, confio no Senhor e sei que não me deixarás ao desamparo”.
Naquela noite, já instalados na favela, a mãe adormeceu chorando escondida para que o filho não percebesse suas lágrimas de tristeza e dor.
No dia seguinte, logo que os primeiros raios de sol invadiram o pequeno e miserável barraco pelas frestas da parede, a mãe levantou-se para preparar o café da manhã. Leite não tinha. Nem café. Só um pouco de chá e um pedaço de pão duro.
Clarindo acordou bem disposto. Percebeu pelo rosto da mãe, inchado de tanto chorar, que ela estava sofrendo bastante.
Satisfeito e sorridente o menino contou:
— Mãe, eu tive um lindo sonho esta noite.
Procurando demonstrar interesse, ela pediu:
— Conte-me, meu filho. Que lindo sonho foi esse?
— Sonhei que estava num lugar muito bonito, todo cheio de flores luminosas, quando vi meu pai que se aproximava. Abraçou-me com carinho e disse-me que tivesse confiança em Deus.
“Sabe, meu filho — disse ele —, nada acontece por acaso. Numa outra existência você e sua mãe, por ambição, prejudicaram muito um seu irmão. Vocês roubaram tudo o que ele tinha e o deixaram na rua da amargura. Sem um lar, maltrapilho, seu irmão vagou por longo tempo vivendo da piedade alheia, até que ficou doente e morreu. É por isso que agora estão passando por tantas dificuldades. Confiem em Deus e suportem as privações com resignação, pois será a libertação de vocês. O Senhor é muito bom e não deixará de assisti-los”.
Surpresa e muito comovida, a mãe de Clarindo deixou que as lágrimas corressem pelo seu rosto. E o garoto, também com os olhos úmidos da emoção que ainda sentia, continuou:
— Engraçado, mãe, é que, enquanto meu pai falava, eu via as cenas que ele descrevia como se fosse um filme. E sabe o que mais? Eu senti que meu pai era aquele irmão que nós prejudicamos! Será que é verdade?
A mãe olhou o filho com carinho e, comovida, falou:
— Meu filho, esta é a resposta de Deus às minhas preces. Atendeu às minhas íntimas indagações através do sonho de uma criança. Sim, Clarindo. Acredito que tudo isso seja verdade. Devemos ter prejudicado muito alguém para que estejamos agora passando por essa provação.
Limpando as lágrimas, fitou o filho com determinação e coragem, e disse-lhe resoluta:
— Vamos vencer, meu filho. Tenhamos bom-ânimo, coragem e muita fé em Deus que é Pai e, tenho certeza, não nos deixará ao desamparo.
Clarindo sorriu feliz ao perceber que sua mãe estava mais contente e conformada.
Nesse instante alguém bate à porta. Clarindo vai atender e se depara com uma mulher pobremente vestida, mas com largo sorriso no rosto simpático. Disse a visitante:
— Olá! Sou Cecília, sua vizinha aqui do lado. Como vocês se mudaram ontem e não tiveram tempo de ajeitar as coisas, trouxe-lhes um pão quentinho que acabou de sair do forno, e uma garrafa com café.
Antes que a mãe de Clarindo tivesse tempo de agradecer a bondade da vizinha, eles viram chegar uma menina franzina, de dez anos mais ou menos, que lhe estendeu uma pequena lata com linda flor plantada:
— Tome, é para a senhora. Fui eu que plantei.
Logo em seguida, surgiu na porta o rosto moreno de um homem que lhe perguntou, sorridente:
— A senhora gosta de chuchu? Trouxe-lhe alguns que colhi agora mesmo no meu quintal.
Sentindo um nó na garganta, e sob forte emoção, a mãe de Clarindo abraçou os estranhos que lhe invadiam a casa como um raio de sol, enquanto pensava que tinha julgado mal as pessoas da favela, e compreendeu que todos os lugares e todas as pessoas são de Deus. Que, em qualquer situação a que formos chamados a viver, encontramos pessoas boas e podemos crescer e evoluir.
E, agradecendo ao Alto as bênçãos do momento, exclamou, sorridente:
— Obrigada. Sejam bem-vindos! Foi Jesus que os enviou!
Autoria: Célia Xavier Camargo
Imagem meramente ilustrativa – Fonte: Internet Google.
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