Anos antes de surgirem os fenômenos tipológicos e as mesas falantes, girantes, através da mediunidade das irmãs Fox, no Estado de Nova York, os quais iniciaram celeremente uma verdadeira revolução nos conhecimentos do porquê de nossa existência, já Louis Alphonse Cahagnet, conceituado magnetizador, nascido em Caen (França), em 1809, mantinha relações com os entes do além-túmulo por intermédio de vários pacientes em estado sonambúlico, ou de êxtase, estados provocados pela ação magnética. Desse intercâmbio surgiu, em 1847, o primeiro tomo de — Arcanes de La vie future Dévoilés, mais ou menos ao mesmo tempo que aparecia nos Estados Unidos a volumosa obra mediúnica intitulada The principies of nature, her divine Révélations and a voice to mankind ditada pelos Espíritos ao reverendo William Fisbough, através da mediunidade de André Jackson Davis.
Do primeiro volume dos Arcanos fez-se uma tradução portuguesa, que sabemos ser muito antiga, mas não podemos precisar (o nome do tradutor e o ano de sua publicação, por falta absoluta de referências nesse sentido).
Na cidade de Argenteuil (arredores de Versalhes), Cahagnet fundava, também em 1847, a sociedade dos Estudantes Swedenborgia, no, que mais tarde se aproximou do Espiritismo kardecista.
Não obstante todo o cuidado que se deve tomar na aceitação das narrativas dos sonâmbulos, Gabriel Delanne é o primeiro a afirmar que com Cahagnet o caso é diferente, sustentando que o célebre magnetista realmente conversou com os Espíritos, identificando muitos deles. "Não são simples reprodução de diferença de vontade e seu dinamismo extraordinário e sua honestidade, adquirir posição de destaque, respeitado e admirado por todos quantos com ele privavam, mesmo os inimigos.
No primeiro tomo dos Arcanos da Vida futura desvendados, o Autor, numa dedicatória aos ilustres magnetizadores Barão du Potet e Hébert de Garnay, este último, gerente do Journal du Magnétisme, declara desassombradamente num certo ponto: "Outros têm temor em revelar verdades que poderiam ofender o espírito das seitas. Se estas últimas sustentam com denodo e boa fé os erros, quanto não devemos nos dar a conhecer a 'fim de esclarecê-las? Acaso devemos temer qualquer coisa quando nos é dado substituir a fé pela experiência, e quando demonstramos a todos a inefável bondade do Criador? Não, senhores, vós o sabeis após haver adquirido, como eu, provas irrefutáveis de um mundo melhor; são estas provas que se torna necessário que todos as obtenham, e a ciência, que propagais com tão' corajosa perseverança, deve fornecê-las a todas as pessoas".
"Se eu não houvesse sido auxiliado pela luz divina, teria sucumbido sob tão penosa tarefa" — declara mais adiante Cahagnet dos seres desaparecidos. Afonso Cahagnet se dissipa nos ares". Vós, O Barão du Potet, homem que na época era um tanto céptico com respeito a essas revelações do Além, mas que mais tarde foi constrangido a acreditar nelas e no mundo dos Espíritos, "por efeito de sério exame dos fatos", no próprio dizer dele, escreve então a Cahagnet longa carta de agradecimento, com alguma ironia, e são individualidades que conversam, se movem, vivem e afirmam categoricamente que a morte não as atingiu" — fala Delanne, confirmando o intercâmbio entre o Além e Cahagnet.
Em 1850 Cahagnet publicou Santuaire du Spiritualisme, ou o Estudo da alma humana e de suas relações com o Universo, segundo o sonanbulismo e o êxtase; em 1851 aparecia Lumière des morts ou Études Magnétiques, Philosophiques et spirétualistes, e Traitement des Maldies,” obra esta que engloba um estudo das propriedades medicinais de 150 plantas que a extática Adèle Maginot transmitira a Cahagnet, além de urna exposição de diversos métodos de magnetização; em 1353, traduzidas do alemão, dava à luz em Paris Lettres odiques-magnétiques du chevalier de Reichenbach.
Embora descendente de uma família pobre, e tendo trabalhado sucessivamente, para poder viver, como relojoeiro, torneiro de cadeiras, caixeiro de comércio, fotógrafo.
De fato, assim fez Cahagnet e, "interrogando os túmulos, falando com os seres falecidos" e anotando as palestras desse maravilhoso intercâmbio, edificou a portentosa obra com cerca de mil páginas, que formaram o tomo I dos Arcanos, descortinando para a Humanidade desorientada uma nova pátria; cheia de vida, de atividade, onde moram os nossos mortos. Na bela introdução a esse monumental trabalho adverte o Autor: "Sede prudentes, não admitais nem rejeiteis nada sem um exame maduro; aquilo que não puderdes compreender, jamais digais que não é" E mais adiante informa: "Esta obra vos oferecerá a prova de um mundo melhor que o nosso, onde vivereis após deixardes aqui o vosso corpo, e onde um Deus infinitamente bom vos recompensará em cêntuplo as aflições que vos eram proveitosas nesta terra de dor. Vou demonstrar que vossos pais e amigos ali vos esperam com impaciência, e que podeis, embora ainda sobre este globo, entrar em comunicação com eles, falar-lhes e deles obter as informações que julgardes necessárias".
Concluindo sua introdução, disse que se sentiria muito feliz se "conseguisse firmar com outros homens essa crença que adquirira sobre a existência desse mundo de consolação, e fizesse penetrar pelo menos em algumas almas toda a felicidade que sentia, de esperanças tão doces".
Ao tomo I dos Arcanos, seguiram-se os tomos II e III. "Tudo o que a ignorância, o fanatismo, tal tolice reeditaram posteriormente contra a nossa doutrina foi então despejado sobre o pobre magnetizador" — diz Gabriel Delanne. Cahagnet, porém, não esmorece. Nessa época, eles, juntamente com outros companheiros, fundam, sob os auspícios da Sociedade dos Magnetizadores Espiritualistas, o jornal Le Magnétiseur Spiritualiste, no qual são consignados todos os fatos maravilhosos das relações com o Além, obtidos por ele e pelos magnetistas de todo o mundo que o quisessem fazer.
Os dois primeiros volumes dos Arcanos contêm as descrições de experiências realizadas com oito extáticos que possuíam a faculdade de ver e conversar com os Espíritos. Adélia Maginot foi uma das mais notáveis, sendo ela a intermediária de extensa série de evocações. Mais de 150 atas foram ratificadas por testemunhas que afirmaram reconhecer os Espíritos que a sonâmbula descreveu. O abade Almignana, doutor em Direito Canónico, teólogo, assistiu com entusiasmo a várias sessões de Cahagnet, tornando-se, adepto do magnetismo e desenvolvendo mesmo, suas possibilidades mediúnicas.
Somente no tomo III dos Arcanos refere-se o Autor aos fenômenos espíritas que se produziam nos Estados Unidos da América, e que foram também registados no nº 162 do Journal du Magnétisme. Neste volume, Cahagnet, em diálogos e refutações, responde vigorosa e inteligentemente aos seus contraditores: padres, homens de ciência, materialistas, etc., pondo por terra os diversos argumentos desfavoráveis ao conteúdo de sua obra. Cita ainda testemunhas merecedoras de crédito que relatam fenômenos de aparição, além de inúmeras respostas do Espírito de Swedenborg à questões formuladas.
Pouco depois de ter saído o primeiro tomo dos Arcanos, o Autor foi premiado por seus denodados esforços: ele recebe várias cartas, onde os signatários expandem sua satisfação, o seu júbilo emocionado por tão gratas revelações.
Outros, entretanto, como o Barão du Potet, acharam que o assunto era cedo ainda para ser tratado. Procederam tal, e qual, até hoje, procedem os nossos irmãos sacerdotes católicos, mesmo os desencarnados sempre a dizerem que o homem ainda não deve conhecer essas profundas questões do ser, sendo-lhe necessária a disciplina dogmática. Mas assim não pensava Cahagnet, e, hoje, nós com ele. Potet, por exemplo, escrevera: "Tratais destas questões com o avanço de 20 anos; o homem ainda não está preparado para compreendê-las", ao que Cahagnet replicou, no vol. III, dizendo: "Ah!
Respondemos então, porque o vemos banhar com suas lágrimas as cinzas daqueles que julga haver perdido para sempre? Em que momento da existência podemos chegar mais a propósito para dizer a esse homem: Consola-te, irmão, aquele que presumes separado de ti, para sempre, acha-se ao teu lado, a te asseverar, por meu intermédio, que ele vive, que é mais feliz do que na Terra, e que te aguarda nas esferas próximas para continuar o convívio contigo."
Qual ocorreu com as obras de Kardec, as de Cahagnet também foram batizadas pelo fogo. A leitura dos Arcanos foi proibida em todos os países católicos, por decisão do Tribunal Supremo e Sagrado, chamado a "Sagrada Congregação", tribunal cristícola e não cristão, diz Cahagnet, tribunal que — informa ainda o Autor "julgou sem nos ouvir e condenou sem outro motivo que o de prazerosamente arremessar três de nossas obras, num só dia, no fogo... Em 1856, um ano antes de aparecer O Livro dos Espíritos, Cahagnet fazia surgir as Révélations d'outre-tombe, pelos Espíritos de Galileu, Hipócrates, Franklin, e outros, obra que estuda Deus, a preexistência das almas, a criação da Terra, vários problemas da Física, da Botânica, da Metafísica, da Medicina, a análise da existência do Cristo e do mundo espiritual, passando em revista as aparições e manifestações dos Espíritos, no século XIX, etc.
Magie magnétique, outra publicação da autoria dele, surgida em 1857 ou 1858, trata dos fenômenos de transporte, de suspensão, das possessões, das convulsões, etc.
O nome de Cahagnet atravessa as fronteiras francesas. Em 1861, ele recebe a honrosa visita do sábio Aksakof que buscava dilatar seus conhecimentos e seus estudos sobre o magnetismo e o psiquismo.
O número de produções aumenta. Aparecem: Encyclopédie magnétique spiritualiste (1854-1861); Étude sur le Matérialisme et sur le Spiritualisme (1869); Étude sur Jâme et le libre arbitre (1880) e várias outras, parecendo-nos que a última obra de Cahagnet tenha sido Thérapeutique du magnétisme et du somnombulisme, impressa em 1883.
Realmente, Cahagnet foi um grande trabalhador, digno, sob todos os aspectos, da nossa admiração e reverência pela muita luz que, a par das críticas que sobre ele choviam, distribuiu entre muitos necessitados do espírito. "Um lutador soberbo", "que teve a glória de fazer-se o que foi: um dos pioneiros da verdade" manifesta-se G. Delanne, com ênfase.
Interrogando os mortos, Cahagnet obteve respostas interessantes e reveladoras sobre diversos assuntos: noções de magnetismo, as propriedades da alma, a oração como meio de evitar os maus pensamentos, o modo por que deve ela ser proferida, as punições reservadas no mundo espiritual aos criminosos, as ocupações dos Espíritos, as sociedades formadas pelos Espíritos, as obsessões, descrição da separação que se faz entre a alma e o corpo no momento da morte, descrição dos Espíritos luminosos, sensações experimentadas no momento da morte, formas diversas que os Espíritos podem tomar, o inferno dos católicos (o que é), o fenômeno dos transportes, reunião dos familiares e afins no espaço, noções sobre a loucura, suas causas, suas consequências no mundo espiritual, alucinações causadas pelos maus Espíritos, O livre arbítrio, a cura pela prece, a linguagem do pensamento entre os Espíritos, a vestimenta dos Espíritos, as consequências do suicídio no além-túmulo, os lugares de reparação do mal, etc. etc. Dezenas de Espíritos, conhecidos e desconhecidos, se comunicaram com Cahagnet.
Embora muitas respostas sejam imperfeitas e incompletas, pois O Espiritismo apenas alvorecia, e embora a obra do magnetista de Caen não se iguale à inimitável exposição feita nos livros de Kardec, todos os espíritas devemos reverenciar a memória, desse homem de fé e de coragem que foi — Cahagnet.
Atualmente o Espírito de André Luiz nos vem dando revelações mais claras sobre a vida no além-túmulo, revelações que resumidamente já estavam explanadas em 1847, nos Arcanos e em algumas outras obras ditadas por sonâmbulos.
Registaremos algumas das perguntas e respostas constantes no livro mencionado:
P. Que fazem os irmãos (da sonâmbula), no céu?
R. — Eles recreiam e passeiam.
— Não se pode recrear e passear durante uma eternidade, sem um fim.
R. — Oh! Eles fazem música, estudam ciências; ocupam-se melhor e com mais prazer que nós.
— Que faz ela (o Espírito da mãe da sonâmbula) no céu?
R. — Ela está com meu pai, meus irmãos, minha irmã, enfim, toda a família; ela se inquieta muito por mim, mas está muito feliz; ela lê e se sente satisfeita em ouvir meus irmãos tocar música. — Há então livros no céu?
R. — Eu te rogo crê-lo, e não são eles romances como na Terra.
— De que falam eles?
R. — Dos mistérios de Deus, das ciências; mas não são escritos da maneira por que o são sobre a Terra, diz-me a minha mãe.
Noutra página, diz o Espírito da mãe da sonâmbula que, para o conhecimento de altos problemas, há instrutores, "que são mais amigos que mestres”.
Eis agora como o Espírito de um sacerdote católico responde a algumas questões:
— A forma da alma que tendes é perfeitamente semelhante à do corpo em que ela habitava? R. — Sim.
— Vós dormis e comeis?
R. Dorme e come quem quer; isto não é uma necessidade como no Planeta; é mais uma satisfação para aqueles que o fazem.
Morais numa casa como na Terra?
R. — Eu estou numa casa; há casas nesta vida, do mesmo modo que sobre a Terra.
— Há também cidades e aldeias?
R. — Eu não sei como se nomeiam as cidades no céu; basta dizer-vos que há casas. Não me ocupo do resto.
Quais são as vossas ocupações ordinárias?
R. — Leio, escrevo e passo parte do meu tempo a aconselhar o bem aos indivíduos inclinados ao mal.
— Podeis então comunicar com eles?
R. — Sim, com os espíritos deles.
O espiritista italiano Ernesto Volpi, tendo publicado, em determinado ano, um artigo em que narrava os primeiros albores do Espiritismo no mundo, foi contraditado por alguns espíritas americanos, que disseram não ter sido Kardec o fundador do Espiritismo, porque antes dele já haviam aparecido Davis e Cahagnet.
Eis como Volpi, em junho de 1890, a isso respondia, com clareza e exatidão: "Os fundadores do Espiritismo são os Espíritos que sempre e em todos os tempos se têm manifestado. Doutro lado, é bom observar que não falei de Kardec somente, mas da Doutrina que ele compendiou. Neste ponto ele é mais completo que os precedentes, precisamente por que sua sábia capacidade coordenadora pôde servir-se também dessas últimas fontes. A Davis e a Cahagnet coube a glória de terem sido os primeiros a recolher os materiais para formar a base do Espiritismo moderno, e a Allan Kardec, a glória de havê-la solidamente estabelecida. “Dessa forma, fica definida a posição de Cahagnet na história do Espiritismo, lugar de pioneiro que sempre será lembrado pelo nosso coração agradecido”.
A 10 de Abril de 1885, com 76 anos, desencarnava, em Argenteuil, o velho batalhador — Cahagnet, a cujo enterro compareceram inúmeros amigos e espiritistas. A esposa, meses depois, o acompanhava.
O jornal Phare, dos departamentos do Seine-et-Oise e do Sena, publicou um artigo necrológico que a Revue Spirite de 1 de maio de 1885 transcreveu e do qual registaremos um trecho:
"Cahagnet é um exemplo raro do que pode uma firme vontade aliada a uma vasta inteligência. Ele se tornara, à força de trabalho e perseverança, um poder do livro”.
O bom livro é o farol que o pensador acende nas trevas do mundo para guiar os homens em sua eterna viagem no espaço infinito. Sem a materialização do pensamento, por meio dos símbolos da linguagem escrita; sem o veículo que a imprensa e o livro representam; sem esse processo de comunicação entre os homens, a Humanidade jamais poderia criar, edificar, iluminar e engrandecer civilizações.
Todos os povos basearam sempre o seu desenvolvimento, a sua grandeza, o seu fastígio, nos escritos transmitidos através de gerações sucessivas. As glórias e os penares, as alegrias e as dores, os triunfos e os reveses, em seus múltiplos aspectos registrados nos livros, serviram de roteiro na contínua sucessão dos dias e dos fatos.
As filosofias, as religiões, as doutrinas, as artes, as ciências, não teriam a história de sua evolução sem o concurso do livro. Sem ele os homens estariam ainda na lendária fase verbal, imersos na obscuridade da noite e impedidos de usufruir os benefícios das grandes conquistas do gênero humano.
É incontestável, pois, o poder do Livro, principalmente do bom livro. E se o livro de caráter edificante, nas especialidades criadoras e históricas, é bom, o Livro Espírita é ótimo porque elucida o espírito sobre o seu Destino Eterno, sobre a Vida Eterna no espaço infinito, quer esteja jungido ao corpo carnal, perecível, na superfície de planetas como a Terra, quer viva nas esferas ou regiões celestes, densas ou rarefeitas, obscuras ou luminosas ou sublimes, de acordo com o mérito de cada um, conquistado através de lutas, esforços e sacrifícios indescritíveis.
Sobre o Livro Espírita é que temos de edificar o templo da verdadeira Sabedoria. É nesse templo que a Humanidade futura terá de fruir a tranquilidade de que necessita para alcançar a felicidade com que sonha.
Difundamos, portanto, o Livro Espírita de modo contínuo, ininterrupto, por toda a parte e em todas as línguas, a fim de que seja estabelecido, na Terra, o reino da fraternidade espiritual que almejamos.
Lins de Vasconcellos, erudito, um profundo metafísico, e adquirira, no mundo que se ocupa do Magnetismo e do Espiritismo, distinguido lugar como publicista. Suas diversas obras e o número é grande traduzidas para o inglês e o alemão, valeram-lhe numerosos testemunhos de estima e simpatia. “Nada mais curioso e mais interessante a esse respeito que sua volumosa correspondência com sumidades científicas e literárias de todos os países”.
A Cahagnet, pois, rendamos as homenagens do espírito, e ele as merece plenamente.
Fonte: FEB.
Imagem meramente ilustrativa (não tenho como comprovar se a imagem é realmente do homenageado) - Fonte: Internet Google.
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